...aparentemente eles tem tudo contra mim, que fui praxista!
Luís Pedro Nunes protagonizou, a meu ver, uma das mais lamentáveis intervenções contra a praxe. Concordo que as praxes que gozaram com o Meco foram de mau gosto, desnecessárias e totalmente reprováveis. Mas isso não dá o direito a ninguém de chamar a praxistas e praxados "grunhos", "imbecis" e "merdas" e dizer que os alunos que compactuam com as praxes deviam ser expulsos das universidades!
O mais interessante no meio disto tudo, e não estou a desculpar qualquer praxe, é a falta de moral que é preciso ter para se dizer isto num programa - o eixo do mal - que tece comentários sarcásticos e piadas sobre a actualidade!
Cada um é livre de dar a sua opinião sobre a praxe, cada um é livre de integrar ou não a praxe. O mais curioso é que sempre vi anti praxe nos recintos das latadas e queimas, sabendo-se perfeitamente que as actividades académicas são um produto da praxe!
Sejamos sinceros, nunca vi praxistas incomodar-se tanto com pessoas anti praxe, como vejo anti praxe incomodar-se tanto com pessoas praxistas!
É curioso que no dia que marca o regresso às aulas (e à praxe) a TVI tenha emitido mais uma reportagem sobre a tragédia do Meco, reforçando sempre a ideia de que estava a decorrer uma praxe aquando daquele incidente e condenando o alegado praxista. Coincidência?
É revoltante chegar a Coimbra e ver como as pessoas olham de lado um grupo de praxe. Os caloiros não estavam mais do que a divertir-se na companhia de doutores, havia risos e corridas. E as pessoas que esperava na paragem pela "carreira" olhavam de lado e teciam comentários. É suposto que Coimbra seja onde nasceu a praxe, é mais do que comum grupos de trajados, caloiros a cantar, noites de praxe, mas por alguma razão já deixou de ser normal praxar e ser praxado. As pessoas que viam divertidas a praxe agora marcam presença para combater este flagelo, porque o que há um ano era divertido hoje é humilhação, se há um ano os trauseuntes incentivavam hoje pedem misericórdia pelos pobres caloiros que estão ali a ser humilhados enquanto se estão a rir. Até esse riso deve ser obrigatório. Contra mim escrevo, mas algo vai mal quando as pessoas dizem o que a comunicação social diz, as pessoas mergulharam numa ignorância tal que não conseguem formalizar uma opinião própria, só o que se diz na televisão é que conta, o que sai nos jornais é a única verdade. Se toda a comunicação social der uma notícia falsa toda a população a considera verdadeira e absorve a opinião dos média (que já não sabem o que é isenção). É este o retrato de uma sociedade cada vez mais hipócrita e com graves problemas de anorexia mental.
Nos próximos dias será, certamente, realizado um tribunal de praxe. Convocados estamos todos, menos a crise, essa declarou-se anti-praxe!
Estava a evitar tocar no assunto que está na ordem do dia: a praxe, quero eu dizer, a anti-praxe. A comunicação social infestou-se de críticas severas - e muitas vezes infundadas - a este tema. Escreveram-se crónicas, reportagens, críticas e desconfio que romances, é um nicho de mercado descoberto com séculos de atraso, mas espremido até à exaustão.
Não me cabe criticar a posição de cada um no que diz respeito à sua concordância, ou não, com a prática praxista, mas não consigo concordar que se generalize a praxe com tão depreciativa adjetivação. Há, com toda a certeza, establecimentos de ensino superior onde a praxe é difícil e abusiva, mas pese-se que a praxe não é feita apenas de trajados, é feita de caloiros. Se há praxe é porque há caloiros que se dispõe a ser praxados, ninguém os arrasta até à praxe e há - pelo menos onde eu estudei havia - documentos que se podem entregar à comissão de praxe (ou orgão semelhante) onde o caloiro se declara anti-praxe!
Apesar do assunto ocupar a maior parte do atual horário nobre da informação, ainda não vi quem procurasse a opinião de quem gosta da praxe, de quem vive a praxe. A televisão (especialmente) procura falar apenas com quem não gostou da praxe, mas cuja cobardia se superioriorizou ao carácter, alimentando assim dúbias expressões como comparar a praxe a "sociedades secretas", esquecendo-se que ela é regida por um livro de estritas regras disponível à comunidade escolar, ao contrário das ditas "sociedades secretas" em que os seus rituais são praticados sem qualquer transparência. Vi também, no DN, a exemplo de vários, uma pessoa que se queixa que chegava a casa cheia de hematomas de fazer granadas, suponho que esteja a tentar dizer que é uma menina muito frágil, caso contrário a culpa é apenas e só de quem faz a granada. A mesma pessoa confessa ainda que entrou na praxe porque - e repare-se - "era muito timidita, aquele tipo de miúda que fez o secundário com 18 e tinha a ideia de que haveria vantagens do ponto de vista académico, supostamente os padrinhos - cada caloiro tem um padrinho ou uma madrinha - facilitavam apontamentos e testes anteriores e se não entrássemos na praxe não teríamos acesso a essas coisas (a ironia é que depois percebi que estava tudo nos computadores da escola). Decidi por isso não me declarar contra", que esmiuçando fica algo de "eu fiz o secundário com 18 valores, sou uma frustrada porque entrei em enfermagem, mas tenho de ter mais facilmente acesso a apontamentos porque sou melhor que voces todos", confirmando a minha tese de que só foram entrevistados cobardes de fraco carácter.
Se quiserem ver o outro lado da coisa, o ano de caloiro foi o melhor ano da minha vida académica, conheci das melhores pessoas e vivi como poucos a praxe, fui às minhas praxes, fui a praxes de outros, baixei a cabeça, corri, rebolei, cantei/gritei, saltei, mas nunca vi a minha integridade física posta em causa, nunca fui (nem vi quem fosse) humilhado, ensinaram-me a praxar e sobretudo a respeitar o traje e ao fim de cada praxe saí de cabeça levantada com aqueles que de entre caloiros e doutores, mais do que isso eram amigos!
Em jeitos de finalizar - que já vou alongado nas horas - se alguma crítica tenho realmente a fazer é a moralidade da televisão em atacar a praxe, é que comparado com a minha praxe a programação das televisões portuguesas é tortura. Mas como em tudo que de mau existe há uma outra perspectiva, consigo também ver uma vantagem, uma única vantagem: é que a crise, o desemprego, troika, défices, referendos e afins devem ter acabado porque não se soube mais deles, na volta declararam-se anti-praxe!
Não sei em que dia decorrerá o tribunal, mas aponta-se como acusados, a comunicação social por passar ao lado da ética, o governo na pessoa de Nuno Crato, porque estando já proíbidas as praxes dentro dos recintos escolares não vejo que mais podem fazer, a não ser meter-se ao barulho só para ficar bem na fotografia, ao restante governo porque sim, e a todos os que me estou a esquecer, também pelas devidas razões. Pede-se então às mesas de acusação e defesa que sejam "mãos largas" no número de pauladas e restantes sanções, apelando-se por fim à mesa dos jurados para que as apliquem com afinco.